segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Não delete simplesmente o Facebook, envenene seus dados antes

Quem está familiarizado com programação pode usar um script que troca suas postagens no Facebook por nonsense, tornando mais difícil para a rede social coletar dados de usuários.

Por Kaleigh Rogers; Traduzido por Marina Schnoor
20 Setembro 2019 - https://www.vice.com/pt_br/article/qv7gbp/privacidade-hackeada-da-netflix-nao-chega-no-ponto

Na esteira do escândalo da Cambridge Analytica começou o movimento #DeleteFacebook. Mas mesmo depois de todos os passos para limpar sua conta, há grandes chances do Facebook ainda ter caches profundos de todos seus dados de usuário, que eles ainda podem usar. Melhor do que simplesmente deletar sua conta é substituir todos esses dados por nonsense, e se manja de programação, você pode fazer exatamente isso.

Kevin Matthew, um ex-administrador de sistemas que tem uma pequena empresa de internet, compartilhou um script que ele criou para substituir os posts existentes no Facebook com textos sem noção criados aleatoriamente. Com um pouco de know-how de programação, você pode usar o script para bagunçar repetidamente todos seus posts no Facebook por vários meses, para praticamente inutilizar o grosso de dados que o Facebook tem de você (apesar disso não ajudar com os dados já minerados por terceiros, como o tipo a que a Cambridge Analytica supostamente teve acesso).

Matthew disse que seu script é simplesmente uma prova de conceito, porque realmente fazer isso pode ser uma violação dos termos de serviço do Facebook (então use por sua conta e risco).

“Minha formação é como administrador de sistemas, faço isso há 20 anos, e todo mundo tem políticas de retenção de dados e backups”, Matthew me disse por telefone. “Com o Facebook, com sua fonte infinita de recursos, só posso imaginar como os dados estão sendo armazenados e retidos.”

O script de Matthew abre automaticamente posts do Facebook para editá-los e substituí-los por texto gerado aleatoriamente. A ideia é que se você rodar o script 100 ou 1000 vezes, durante vários meses, em todos os seus dados, provavelmente isso vai dificultar para o algoritmo do Facebook tirar dados úteis que ele usa para criar um perfil de você, incluindo suas tendências políticas e orientação sexual.

“Todo pedacinho de informação contribui com esse perfil invisível que eles estão construindo de você”, Disse Matthew. “Se conseguirmos ofuscar o mínimo que seja, isso devolve o poder nas nossas mãos como os usuários finais.”

Enquanto até agora ele só fez uma prova de conceito para posts, no futuro Matthew disse que pode ser possível construir scripts similares para “envenenar” o resto dos seus dados no Facebook, como rastrear que sites você visita tendo um script que visita milhares de sites aleatórios quando você loga na sua conta. Para tornar o script mais acessível para não-programadores, também seria possível criar um aplicativo de desktop que roda todos os scripts para um usuário médio.

Não sabemos até onde vai o histórico de dados do Facebook de seus usuários, e como os dados são armazenados e retidos, mas esse é um jeito de pelo menos tentar mandar um dedo do meio para a plataforma antes de abandoná-la pra sempre.

Mas Matthew me disse que seu principal objetivo é conscientizar e chamar atenção para o fato de que EUA e Canadá não têm leis de “direito de ser esquecido”, algo que poderia proteger o direito dos usuários de ter seus dados apagados quando eles querem deixar um site.

“Talvez meu script não tenha um impacto tão grande em escala global, mas talvez comece uma discussão sobre proteger nossa privacidade”, disse Matthew. “Se quero que meus dados sejam apagados, eu deveria ter o direito de fazer isso.”

Matéria originalmente publicada pela VICE EUA.

https://www.googletagmanager.com/ns.html?id=GTM-WFTSG7B

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'Privacidade Hackeada' da Netflix não chega no ponto

O verdadeiro 'hack' não é a Cambridge Analytica, o Facebook ou as eleições de 2016. É o sistema que tornou nossas tragédias de dados inevitáveis.

Por Janus Rose; Traduzido por Marina Schnoor
30 Julho 2019, 7:00amCompartilheTuíte

“Quem já viu um anúncio que te convenceu que seu microfone está ouvindo suas conversas?”, David Carroll pergunta a seus alunos no começo de Privacidade Hackeada, o novo documentário da Netflix sobre privacidade de dados e desinformação na internet. Carroll ri nervoso quando quase todas as mãos da classe se levantam.

A resposta é perturbadora, mas não uma surpresa – uma boa introdução para uma história sobre a Cambridge Analytica, a empresa agora infame que forneceu dados de segmentação de anúncios para a campanha de Trump na eleição de 2016. A empresa, como sabemos agora, peneirou os dados de questionários do Facebook para construir milhões de perfis psicográficos, depois os usou para hiperdirecionar anúncios para os eleitores com campanhas publicitárias personalizadas. Como o homem que fez a denúncia, Christopher Wylie, diz de maneira sucinta mais tarde no filme, a Cambridge Analytica não é uma empresa de ciência de dados, mas uma “máquina de propaganda”.

Mas mesmo que a narrativa de Privacidade Hackeada sobre a guerra de privacidade e informação possa abrir os olhos de muita gente, o documentário não consegue mostrar o grande panorama das coisas. O “grande hack” não foi o uso mal-intencionado de dados pela Cambridge ou o fracasso do Facebook em proteger esses dados. O hack é todo o modelo de negócio do Vale do Silício, que incentiva o uso de dados pessoais para manipular o comportamento humano em grande escala.

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Alguns anos antes de todo mundo ouvir o nome Cambridge Analytica, a ex-professora da Escola de Administração de Harvard Shoshana Zuboff cunhou um termo para esse fenômeno: Capitalismo de Vigilância. Como ela define, Capitalismo de Vigilância é uma “lógica de acumulação” econômica que envolve extrair dados pessoais de maneira muitas vezes irreconhecível, criando “novos mercados para previsão, modificação e controle comportamental” que exploram esses dados como seu principal recurso.

Em outras palavras, esse é o modus operandi de empresas como o Facebook e Google, que dependem dos usuários fornecendo um fluxo constante de fotos, likes e outros dados úteis que podem ser usados para mapear relacionamentos, medir respostas emocionais e sim, direcionar anúncios. E quando se trata de publicidade, o santo graal da propaganda é conseguir prever o comportamento das pessoas – e assim manipulá-lo.

Considere essa citação do artigo de 2015 de Zuboff, atribuída a um cientista de dados anônimo de uma empresa do Vale do Silício:

“O objetivo de tudo que fazemos é mudar o comportamento real das pessoas em certa escala. Quando as pessoas usam nosso aplicativo, capturamos seus comportamentos, identificamos comportamentos bons e maus, e desenvolvemos maneiras de recompensar os bons e punir os maus. Podemos testar quão eficientes nossas sugestões são para as pessoas e quão lucrativas para nós.”

Como jornalista e educadora que cobre privacidade por mais de uma década, considero essa citação um resumo perfeito da mentalidade do Vale do Silício. É minha principal referência quando alguém me diz que tem medo da vigilância do governo, mas não se importa com corporações como Amazon e Facebook coletando seus dados. Programas nefastos do governo como reconhecimento facial e policiamento preventivo não vêm do nada. São uma consequência inevitável de um sistema que incentiva um acúmulo infinito de dados por lucro, o que por sua vez abastece a máquina de vigilância do governo que frequentemente se volta contra imigrantes, ativistas e outros grupos marginalizados.

Quando a Cambridge Analytica ficou sob os holofotes da mídia, eu esperava que o caso iniciasse um diálogo sobre o complexo industrial de vigilância e as estruturas capitalistas adjacentes que o dirigem. Mas Privacidade Hackeada foca a maior parte de seu tempo em dissecar os sintomas: especificamente, como uma empresa vem a possuir o poder aterrorizante de influenciar eleições, e como o Facebook não conseguiu impedir isso.

Em uma sequência, Brittany Kaiser, uma ex-executiva da Cambridge de motivação dúbia e um dos principais temas do filme, explica como a máquina de propaganda da empresa funcionava. O principal alvo dessa máquina eram os “persuadíveis”, pessoas com perfis psicográficos que sugeriam que estavam abertas a sugestões. Quando seus gatilhos específicos eram identificados, o conteúdo era personalizado para visar seus medos e inseguranças mais profundos. “Aí as bombardeávamos com anúncios”, diz Kaiser, “até elas verem o mundo como queríamos que elas vissem. Até elas votarem no nosso candidato”.

Naturalmente, o principal antagonista do filme é o CEO da Cambridge Analytica Alexander Nix. Ele é um cara inegavelmente desonesto, e o filme o mostra dando declarações que mais tarde são contraditas por Kaiser e outros, se esquivando de perguntas da mídia, e pego numa filmagem com câmera escondida se gabando de seus feitos – incluindo oferecer usar trabalhadoras sexuais para fazer armadilhas e desacreditar oponentes políticos. O vemos se contrair em audiências diante do Parlamento do Reino Unido, onde ele é duramente criticado por como as manipulações de sua empresa renderam vitórias para Trump e os defensores do Brexit, o que acabou desencadeando a saída tortuosa do Reino Unido da União Europeia.

Depois vemos trechos dos membros do Congresso americano balançando a cabeça para Mark Zuckerberg sobre a falha do Facebook em prevenir o desastre – ao que Zuckerberg responde com suas falas padronizadas e agora sem sentido sobre “sentir muito” e prometer “melhorar”. Mas diferente de Nix, o filme parece ainda ter alguma fé em Zuckerberg, e na indústria de tecnologia como um todo.

Em uma cena quase no fim do filme, a jornalista do Guardian Carole Cadwalladr, que cobriu extensamente a história da Cambridge Analytica, sobe ao palco do TED para confrontar Zuckerberg, Jack Dorsey e outros líderes da indústria. Falando com “os deuses do Vale do Silício”, ela pede que eles considerem o dano que causaram, e que mudem seu modo de agir pelo bem da democracia.

“Essa tecnologia que você inventaram tem sido incrível, mas agora é uma cena de crime, e vocês têm a prova”, diz Cadwalladr. “E agora não é o suficiente dizer que vão melhorar no futuro.”

O trecho deveria ser um momento empoderador. Vemos uma jornalista falar a verdade para os poderosos e exigir responsabilização das plataformas de tecnologia para mediar nosso mundo. Mas Cadwalladr não parece considerar que titãs do Vale do Silício como Zuckerberg – agora um veterano em incontáveis escândalos de privacidade e turnês subsequentes de desculpa – simplesmente não se importam.

No começo do mês, a Federal Trade Commission multou o Facebook em US$ 5 bilhões por uma longa história de violações de privacidade vindo desde 2010. Mesmo sem precedentes, a “punição” na verdade foi um bom negócio para a empresa, que fez quase quatro vezes essa quantia em receita no último trimestre. Quando a decisão foi anunciada, o preço das ações do Facebook não sofreu – na verdade subiu.

Melhor ainda para o Facebook, a multa efetivamente absolveu a empresa e seus executivos de quase uma década de problemas de privacidade e práticas enganosas – incluindo permitir que a Cambridge Analytica colhesse dados de 87 milhões de pessoas.

Capitalismo de Vigilância é um modelo de negócio no Vale do Silício. Se o acúmulo infinito de dados é a lógica central da indústria, podemos mesmo esperar que qualquer coisa seja uma mudança significativa? Em vez de perguntar como o Facebook poderia ser punido, não deveríamos nos perguntar se o Facebook deveria mesmo existir?

Na conclusão de Privacidade Hackeada, ironicamente é Julian Wheatland, ex-CEO da Cambridge Analytica, que toca no que deveria ser a tragédia central do filme: que esse desastre estava codificado no próprio sistema que deu à luz ao Vale do Silício moderno.

“Sempre haverá uma Cambridge Analytica”, ele confessa para a câmera. “Só é uma merda pra mim que ela tenha sido a Cambridge Analytica.”

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Como apagar os dados que Google e Facebook juntam há anos sobre você
04 Abril 2018 - https://www.vice.com/pt_br/article/59jyyk/dados-google-facebook?utm_source=stylizedembed_vice.com&utm_campaign=qv7gbp&site=vice

Mergulhei nas profundezas de meus dados digitais para entender o que duas das maiores empresas do mundo repassam sobre mim — e como podemos conter essa avalanche.

Escrevo pro Motherboard há um tempinho e, para mim, nunca foi novidade a forma como empresas como Google e Facebook tocam seus negócios. (A quem não sabe: vendendo propagandas baseadas em nossos dados.) O que me deixou intrigado foi sacar que talvez seja mais fácil abrir o teoricamente inviolável banco de dados dessas empresas do que se acreditava — como o escândalo da Cambridge Analytica mostrou nas últimas semanas.

Há dias resolvi fazer o teste e baixei tudo que essas duas companhias sabem sobre mim. Queria sanar uma série de dúvidas que surgiam: qual o tamanho dos meus rastros digitais? O que eu, um cara supostamente esclarecido quanto às políticas digitais, deixaria passar em relação a minha privacidade? O que as redes sociais e apps sabem sobre mim e repassam a outros?

Conforme eu descobria a sangria de meus dados, buscava meios de contê-la. É o que conto nessa jornada em busca de minha identidade digital logo abaixo.

Tudo que o Facebook sabe sobre mim

Agenda, mensagens, locais, rostos e likes dizem quem sou em poucos megabytes

Como a rede social de Mark Zuckerberg acaba sendo uma das primeiras acessadas durante meu dia — ou um de seus outros produtos como Whatsapp, Instagram ou Messenger —, acabou sendo minha primeira opção na jornada.

Para ver o que eles tinham sobre mim, o primeiro passo foi acessar a página de Configurações. Logo embaixo das “Informações básicas da minha conta”, no cantinho inferior esquerdo do menu central da página, há a opção para “Baixar uma cópia dos seus dados do Facebook”. Você deve esperar alguns minutos para poder fazer o download, mas rola numa boa.
O tamanho do arquivo vai depender do quanto você compartilha suas informações, fotos e vídeos etc. Quanto mais uso, mais dados. Se você usa o Messenger para se comunicar, por exemplo, mais material ainda você está fornecendo.

Eu, embora cadastrado na rede de Zuckerberg há dez anos, não sou dos usuários mais ativos: o arquivo com todos meus dados entregues ao Facebook não chega a ter 300 MB. O tamanho reduzido, porém, esconde um monte de coisa que eu preferiria que não tivessem sido compartilhadas.

As fotos daquela viagem triste tiradas em 2010 que eu havia esquecido da existência, todas as mensagens enviadas, todas as recebidas, localizações geográficas. Basicamente tudo vem junto no arquivo. E se você, como eu, instalou o aplicativo da rede social no seu celular, há um bônus meio perturbador que é toda a sua agenda de contatos. Número de telefone fixo, celular, e-mail; quanto mais completa a informação que você adicionou na agenda, mais completa é a informação que o Facebook vai ter acesso.

Além disso, informações como os dados brutos do seu rosto vem junto nesse pacotão. Pode parecer meio bizarro, mas sabe aquela opção aparentemente inofensiva que permite que o Facebook reconheça e tagueie você nas fotos dos outros? Os dados brutos estão aí e podem ser usados por ele no futuro.

Ok, mas como isso é útil para a empresa? Bom, a essa altura do campeonato você já deveria saber que propaganda é a alma do negócio. Segundo a BBC, em 2016, dos US$ 7 bilhões do faturamento da empresa, cerca de US$ 6,38 bilhões tiveram a publicidade como fonte. Na época, a estimativa foi que o seu perfil rende à empresa por volta de R$ 50 ao ano. É meio barato se você pensar o tanto de coisa que você revela sobre si.
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CRÉDITO: CAPTURA DE TELA/FACEBOOK

E a coisa toda acontece de forma bastante eficiente: uma vez que você curtiu uma série de páginas, elas dão a dimensão exata do que você provavelmente vai comprar. Meus likes em vídeos de animais fazem, toda semana, pintar anúncio de pet shops, e por aí vai. Dá pra saber quais são os assuntos que o Facebook acha que você vai comprar olhando na parte de publicidade deles.

Com o desconforto causado depois de sacar o que a rede social de Zuckerberg sabe sobre mim mesmo sem eu dar tanta importância a ela, tive impulso de deletar a minha conta, sair dali, mandar uma mensagem geral avisando o fim do meu perfil e nunca mais colocar o pé ali. Mas nem tudo é exatamente simples assim. Fui em busca de soluções melhores.

Como limpar o lodo: evitar apps e sujar os próprios dados

Se você, como eu, não quer compartilhar tantas informações assim com a rede social, um bom começo é se livrar de qualquer aplicativo dela no seu celular. Uma breve lida nas permissões que você concede aos aplicativos mostra que eles pedem um acesso bastante completo ao seu aparelho. Provavelmente você já ouviu a história de que o Facebook ouve suas conversas sem você saber, o que pode ou não ser uma lenda urbana.

Outra medida importante é restringir o que você compartilha com seus aplicativos. Não existem muitas razões para você compartilhar as informações de onde estudou e eventos que vai comparecer com um teste que só vai manipular uma das suas fotos de perfil, tipo aquele do “Como seria sua versão de sexo oposto”, entre outros similares. (Eu, aliás, caí nessa, confesso.)

Na página de "Configurações" é possível excluir o acesso que aplicativos de terceiros têm à sua conta. Só que há um detalhe importante: as informações que já foram coletadas pelo Facebook não são deletadas no ato da desvinculação da sua conta, como ficou claro quando estourou o escândalo da Cambridge Analytica.

Uma solução mais radical seria desabilitar a permissão do Facebook para fazer login em aplicativos de terceiros, como mostrada no campo “Aplicativos, sites e plug-ins” nas "Configurações dos aplicativos". E mais importante: preste atenção com coisas como termos de privacidade e o acesso às informações que você concede a programas, sites e apps.

É claro, você sempre têm a opção de deletar totalmente a sua conta na rede social. Se essa for a sua opção, o Facebook afirma que em até 90 dias tudo sobre você será deletado dos servidores da empresa.

Também é possível tentar sujar os seus dados que a rede social coletou ao longo dos anos. Com um script que altera suas postagens com textos gerados randomicamente, a solução requer algum conhecimento em programação. O autor do código defende que, se rodado uma vez, talvez programa não faça muita diferença; depois de cem ou mil alterações de uma mesma postagem, porém, fica mais difícil resgatar informações verdadeiras sobre você e, assim, suas postagens passam a ser inúteis para o banco de dados da empresa.

De qualquer maneira, antes de adotar qualquer uma das medidas, para não perder coisas importantes como fotos antigas, existem outras formas para resgatar coisas importantes na rede, como explicamos nessa matéria.

Feito o trabalho no Facebook, está na hora de passar para a próxima empresa que sabe mais sobre mim do que minha própria mãe.

Tudo e mais um pouco que o Google sabe sobre mim

Buscas, emails, documentos, vídeos e perfil de compra dizem mais sobre mim do que meus amigos próximos sabem
Você procura coisas na internet pelo Google? Sua conta de e-mail é Gmail? Seu celular usa sistema operacional Android? Você escreve textos no Docs? Assiste a vídeos pelo YouTube? Cria planilhas eletrônicas no Sheets? Abre o Maps para se localizar? Acessa à internet usando o Chrome? Usa o compartilhamentos de arquivos do Drive? Quanto mais afirmativas foram suas respostas nos últimos segundos, maiores serão os arquivos disponíveis para download e o volume de dados que o Google têm sobre você.

Assim como o site de Mark Zuckerberg, o Google permite baixar um grande volume de dados que você entregou sem muita dificuldade. A tendência é que o tamanho do arquivo seja bem maior, já que a extensão do seu envolvimento pode ser bem mais ampla. Se você não quiser baixar para analisar com mais calma o que o Google sabe sobre você, também é possível acessar um painel que centraliza os dados que o a empresa têm sobre você.

No meu caso, em três contas de e-mail — duas pessoais e uma profissional — foram mais de 20 gigabytes de dados gerados desde 2010. Fotos vexatórias guardadas no Drive, documentos com ideias ruins de textos abandonadas, tudo agora salvo em meu HD. A máxima “vaza meus nudes, mas não vaza meu histórico de buscas” também é outro pensamento inevitável consultando o histórico de buscas e achando termos como “hatoful boyfriend walkthrough”, entre outros mais pessoais e vexatórios.

Outro ponto que o histórico de buscas revela é o quanto de informações são entregues se você não estiver prestando atenção. Buscas com a localização geográfica de onde elas foram efetuadas são algo perturbador de se ver. Não que eu não soubesse disso, mas ver os dados escritos na página dão dimensão do quanto nos expomos em cada simples pesquisa.
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BUSCAS LOCALIZADAS. CRÉDITO: CAPTURA DE TELA

Você já deve ter visto o seu navegador pedir sua localização. Se você der esse acesso, ajuda a detalhar e a tornar mais certeira as informações que a empresa têm sobre você. Isso também ajuda a otimizar quais são os anúncios certos para você.

Como já é sabido, a oferta e veiculação de anúncios é também uma das principais fontes de renda do Google. Por meio de uma base de dados imensa — no meu caso, 20 gigabytes — fica fácil te oferecer algo que você provavelmente vai comprar.

Vale ressaltar que todos esses serviços possuem seus dados, já que mudança na política de privacidade do Google em 2012 transformou a política de todos os seus mais de 70 serviços em uma só. Isso significa que o serviço de publicidade da empresa, o Adwords, sabe qual é o tipo de conteúdo que você anda buscando ao longo do tempo.

Outro ponto de interessante e pouco legal é acessar o perfil de consumo que a empresa formulou sobre você com base nesses dados coletados. A própria página informa a como o seu histórico é valioso para fazer esse tipo de oferta: “Podemos mostrar, também, anúncios baseados em páginas que você visitou anteriormente”. De uma coisa você não pode reclamar: eles bem que avisaram...

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Deixando as coisas um pouco menos piores

O caso do Google é um pouco mais complicado do que o Facebook, pois o volume de informações compartilhadas é bem maior e, dependendo do quanto você usa os produtos da empresa, mais difícil é tirar da sua vida.

Por padrão todas as atividades em plataformas do Google são salvas. Se você não quer mais que isso aconteça, é melhor deletar o histórico de atividades e desabilitar que ele continue a ser gravado.

DASHBOARD COM MEUS DADOS NO GOOGLE. CRÉDITO: CAPTURA DE TELA

Um bom começo é desativar os armazenamentos mais óbvios que a plataforma faz dos seus dados. Para impedir a gravação das informações é possível acessar a página onde a empresa mostra quais informações estão sendo salvas. Nela é possível “pausar” a captação de uma série de dados como: histórico de busca em navegadores e aplicativos, histórico de localização, informações de dispositivos móveis, registros de voz e áudio, buscas do YouTube e vídeos visualizados na plataforma. Dentre esses dados, talvez o principal seja desligar a “linha do tempo” de localização do Maps, pois não necessariamente é algo legal ter os dados exatos das suas caminhadas. Em especial se essas informações são sensíveis.

Se você também quer deixar de usar o serviço de fotos da empresa, é necessário deletar manualmente suas fotos. O problema aqui é o volume de dados que cada foto contém. O aplicativo é bastante cômodo, mas capta muita coisa que talvez você não queira: reconhece a face das pessoas que estão com você nas imagens, o local onde foram tiradas (se você deixou o GPS ligado) e uma série de metadados que as imagens contém.

Além disso, é importante revisar os aplicativos de terceiros que estão diretamente ligados na sua conta. Nesta página você acessa quais são e quais informações você está compartilhando. Quanto à navegação com o Google Chrome e o Android, a solução, se você não quiser dar nenhuma informação sua à empresa, é uma só: pare de usar.

Pronto, agora só falta ficar ligeiro
Depois do expurgo de contas e praticamente me tornado um ermitão digital, essas empresas deixaram de ter informações sobre mim e agora posso ficar tranquilo que não usarão minhas infos por aí. Certo? Bom, a resposta pra isso é um pouco mais complicada. Apesar das empresas negarem, elas podem manter suas informações caso você use o serviço delas. No Brasil, o próprio Marco Civil estabelece que as empresas prestadoras de serviços devem manter registros de acesso por um prazo de pelo menos seis meses.

Outro fator importante: muitos sites utilizam plugins tanto do Google quanto do Facebook. Usando extensões como o Ghostery ou o Privacy Badger é possível ter uma dimensão de quais são os cookies — um pequeno arquivo de dados que permite identificar a seção de sua máquina — que estão sendo utilizados no site e bloqueá-los.

Para se ter uma ideia do quanto o seu navegador está exposto a este tipo de programa, é possível fazer o teste do projeto Panopticlick, da Electronic Frontier Foundation. E para se ter certeza de ter o máximo de privacidade, o jeito é navegar usando Tor.

Não é nada fácil manter sua privacidade a salvo, mas, no fim, valerá a pena. Seus dados são muito importantes e, se forem usados de uma forma errada, vão te dar uma dor de cabeça maior bem maior do que 50 reais por ano. Cuide bem deles.

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