FSP - Marcella Franco - 25.06.19
Stickers com memes, trocadilhos, celebridades e políticos são trocadas e viram o novo papel de carta
Na evolução da linguagem do WhatsApp, os emojis parecem já se encaminhar para o ostracismo. Stickers ou figurinhas de humor obtidas de forma mais exclusiva, por meio de trocas de mensagens e em grupos secretos, fazem sucesso no aplicativo de mensagens substituindo interações escritas ou faladas.
Embora tenha sido liberado para os usuários há cerca de oito meses, o recurso demorou até se popularizar. Agora, movimenta conversas de pessoas de idades variadas e impulsiona grupos virtuais nos quais se entra apenas para descolar as últimas novidades no mercado.
Memes novos e antigos, trocadilhos infames, celebridades, políticos e pessoas comuns recortados são usados como respostas em diálogos —especialmente em grupos, até como forma de ostentação perante os outros membros.
A exemplo do que experimentavam os adolescentes dos anos 1980 e 1990, que tinham como sonho de consumo os papéis de carta estampados por bichinhos fofos e tremiam de ansiedade diante das folhas mais raras, os jovens de hoje regozijam na busca pelo sticker mais insólito —e, por isso, considerado mais hype.
“De primeira, essa onda de figurinhas não me cativou muito, mas começaram a aparecer umas tão boas que ficou impossível resistir. Por ter aderido tarde à moda, acabei caindo de paraquedas quando meus amigos já não estavam mais trocando tanto. Foi aí que descobri que existiam grupos exclusivos só para isso”, conta a estudante Manuela Trocoli, 17.
Só que o caminho para entrar nos tais grupos não é dos mais fáceis. Primeiro, é preciso participar de um grupo no Facebook, mas, como são secretos e não aparecem na busca geral da rede, é preciso ser convidado por um membro para conseguir entrar.
Uma vez lá dentro, recebe-se um link para um chat de WhatsApp. Para entrar, é preciso esperar que um participante saia. Manuela passou três semanas clicando diariamente no link que recebeu. “Fiquei felizona quando entrei, e recebi até boas-vindas. Agora, tenho um arsenal”, gaba-se ela, hoje dona de 750 stickers.
Antes de virar moda no WhatsApp e ficar cada vez mais criativas, figurinhas mais básicas já ilustravam os bate-papos no aplicativo Telegram. Foi lá que a professora e estilista de tricô Cristiane Eloisa Bertolucci, 35, começou sua coleção, hoje com mais de cem unidades.
“Fiz alguns stickers fofos, mas também usava uns de celebridades como Neymar, Hebe e Xuxa. Hoje em dia meus favoritos são o ‘Deus leu o que você apagou’ e o do astronauta que diz ‘Olha eu aqui no vácuo’, para quando alguém não responde à mensagem.”
Para o advogado Daniel Papaterra, 26, a preferência é muito relacionada aos assuntos do noticiário. “No momento meu favorito é o ‘Aqui é o hacker’”, explica. “Quando recebo um inédito que gosto, mando para quem acho que gostaria de receber.”
“O humor sempre melhora a imagem de quem entretém e, na internet, virou um ativo social”, avalia o professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) Arthur Igreja, especialista em tecnologia e inovação. Por isso, quando a pessoa passa a figurinha adiante, fica na expectativa para saber qual foi a reação de quem recebeu —uma espécie da avaliação desse ativo e de seu poder de divertir.
“Piadas sempre existiram, especialmente no Brasil. Os memes e, agora, os stickers são um canal novo para esse comportamento jocoso”, afirma Igreja.
Para o psicólogo e doutor em neurociência do comportamento Yuri Busin, as figurinhas estimulam a convivência. “Nossa sociedade tem muita dificuldade de se comunicar, ainda mais na forma escrita. Os stickers ajudam bastante na comunicação dos sentimentos. Além disso, é importante que as pessoas mais velhas tentem sempre ter contato com novas tecnologias para a evolução própria. Existe espaço para todos, e esta pode ser uma troca de conhecimento muito interessante entre mais velhos e mais novos.”
Além de frequentar os grupos e trocar com amigos, os usuários de Android e iOS podem baixar programas que permitem transformar fotos e imagens em stickers.
“Pego fotos minhas, de amigos e da família e crio os meus próprios”, diz Patricia Ingo Tendrich, 47, jornalista, também fã declarada das figurinhas de cunho sexual. “Minha filha sabe que gosto das eróticas e me fornece várias. Quando mando para os amigos, é alegria geral. Todo mundo gosta de uma sacanagem, né?”
A única queixa dos usuários em geral é não poder organizar nem categorizar as figurinhas no arquivo do aplicativo.
Para João de Mari, 22, jornalista, a demora na resposta do interlocutor —que na verdade está apenas procurando na biblioteca o sticker escolhido— pode parecer má educação.
“Poderia ser possível criar pastas. Quando se busca uma no meio de 400, é difícil de achar”, diz Mari que, recentemente, por conta dessa falta de ordenação, acabou apertando sem querer no sticker errado. “Mandei uma figurinha do tipo ‘Estou dando bom dia, mas queria dar outra coisa’ no grupo da família. Por sorte não viram, e deu tempo de apagar.”
Por isso, também há figurinhas que ridicularizam quem apaga as mensagens —nada passa incólume no universo dos stickers.